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Fragmentos

 

Música Submersa

Não quero ser o grande rio caudaloso

Que figura nos mapas.

Quero ser o cristalino fio d’água

Que canta e murmura

Na mata silenciosa.

 

“(...) eu fui namoradeira, flertei, tive namorados. Me apaixonei perdidamente, tive perdas. Tenho certeza de que Deus me quis poeta. Se eu tivesse me casado, vocês não estariam lendo esses poemas: marido e filhos consumiriam meu temperamento amoroso. Poemas e minhas ex-alunas são meus filhos. Transferi o amor para outra escala. Para mim, o amor ficou sendo só um sentimento, um sonho.” (http://polacodabarreirinha.blogspot.com.br/2005/10/helena-kolody-o-corao-da-poesia.html)

 

SONHAR

Sonhar é transportar-se em asas de ouro e aço

Aos páramos azuis da luz e da harmonia;

É ambicionar o céu; é dominar o espaço

Num vôo poderoso e audaz da fantasia.

Fugir ao mundo vil, tão vil que, sem cansaço,

Engana, e menospreza, e zomba, e calunia;

Encastelar-se, enfim, no deslumbrante Paço

De um sonho puro e bom, de paz e de alegria.

É ver no lago um mar, nas nuvens um castelo,

Na luz de um pirilampo um sol pequeno e belo;

É alçar constantemente o olhar ao céu profundo.

Sonhar é ter um grande ideal na inglória lida:

Tão grande que não cabe inteiro nesta vida,

Tão puro que não vive em plagas deste mundo.

 

“Venho de um tempo em que a poesia era rigorosamente metrificada, do tempo do soneto, embora sempre procurando caminhos novos. Hoje, meus versos são polimétricos e, ainda, têm ritmo. Embora não pareça, o verso moderno é muito mais sutil do que o tradicional. Na poesia moderna, os ritmos são livres, nascidos da idéia a expressar-se; o poema tem um ritmo interno, ajustado ao corpo da idéia. Esse modo de versejar não é tão novo como parece. Até os versos da Bíblia são de ritmo leve.” (KOLODY, 1986, p. 15)

(KOLODY, Helena. Helena Kolody: um escritor na Biblioteca. Curitiba: BPP/ SECE, 1986.)

 

Lição

1980

 

A luz da lamparina dançava

frente ao ícone da Santíssima Trindade.

 

Paciente, a avó ensinava

a prostrar-se em reverência,

a persignar-se com três dedos

e a rezar em língua eslava.

 

De mãos postas, a menina

fielmente repetia

palavras que ela ignorava,

mas Deus entendia.

 

Evasão

 

Despiu a roupa

de prisioneiro.

Fugiu do cárcere.

 

Os jornais disseram

que morreu.